Saí de casa com a missão de comprar uma sandália para minha mãe. Tinha que ser muito confortável, ela tem diabetes e deve evitar de todo modo machucar os pés. Pra quem não sabe, esse probleminha - ela não gosta que chamem de doença - provoca uma grande sensibilidade, à flor da pele mesmo. Tem que usar roupas leves, sapatos confortáveis, enfim, nada que provoque irritação, muito menos ferimentos.
Entrei numa loja decidida a encontrar uma sandália bem macia e gostosinha para ela. Um senhorzinho sorridente mas um tanto atrapalhado me atendeu. Expliquei a ele exatamente o que queria, que minha mãe tem diabetes, etc. etc. e etc.
- Qual o número? - pergunta ele.
- Trinta e quatro - respondo.
- Com esse número só temos para crianças.
- Mas ela é uma senhora e calça 34.
- Não sei se temos nesse número para adultos.
- Se o senhor puder procurar, eu agradeço - haja paciência!
Com um pouquinho de boa vontade ele vasculhou e achou.
- Temos este modelo aqui - o senhorzinho levou-me até a vitrine e me mostrou duas sandálias do tipo que eu queria. Uma era preta, a outra bege.
Pedi a ele que buscasse uma para eu ver de perto e sentir a textura.
Enquanto ele sumia no depósito, saquei o celular e liguei para casa, inquirindo minha mãe sobre a cor de sua preferência. No momento em que falava com ela, o senhorzinho voltou, trazendo consigo uma sandália preta.
- Só tem esta - foi logo dizendo.
- Ah, a senhora prefere a bege? - disse eu ao telefone.
- Diga a ela que foi feita com couro de vaca virgem - diz o homenzinho.
- Mãe, só tem a preta.
- Foi feita com couro de vaca virgem.
- Pode ser a preta, então? Está bem, tchau!
- Couro de vaca virgem, altíssima qualidade - repetia ele, ignorando a existência da sociedade protetora dos animais.
Como nem sempre sou politicamente correta, comprei a sandália, não sem uma certa culpa. Coitada da vaca, além de lhe tirarem o couro, ainda morre virgem - pensei.
Mas que diferença faz pro calçado se a vaca deu ou não? Começo a suspeitar que essa sandália tão fofinha foi feita com a puríssima e honestíssima genitália da vaca. Será? Melhor ocultar da minha mãe esse detalhe sórdido.
(São Luís, abr/2008)
Entrei numa loja decidida a encontrar uma sandália bem macia e gostosinha para ela. Um senhorzinho sorridente mas um tanto atrapalhado me atendeu. Expliquei a ele exatamente o que queria, que minha mãe tem diabetes, etc. etc. e etc.
- Qual o número? - pergunta ele.
- Trinta e quatro - respondo.
- Com esse número só temos para crianças.
- Mas ela é uma senhora e calça 34.
- Não sei se temos nesse número para adultos.
- Se o senhor puder procurar, eu agradeço - haja paciência!
Com um pouquinho de boa vontade ele vasculhou e achou.
- Temos este modelo aqui - o senhorzinho levou-me até a vitrine e me mostrou duas sandálias do tipo que eu queria. Uma era preta, a outra bege.
Pedi a ele que buscasse uma para eu ver de perto e sentir a textura.
Enquanto ele sumia no depósito, saquei o celular e liguei para casa, inquirindo minha mãe sobre a cor de sua preferência. No momento em que falava com ela, o senhorzinho voltou, trazendo consigo uma sandália preta.
- Só tem esta - foi logo dizendo.
- Ah, a senhora prefere a bege? - disse eu ao telefone.
- Diga a ela que foi feita com couro de vaca virgem - diz o homenzinho.
- Mãe, só tem a preta.
- Foi feita com couro de vaca virgem.
- Pode ser a preta, então? Está bem, tchau!
- Couro de vaca virgem, altíssima qualidade - repetia ele, ignorando a existência da sociedade protetora dos animais.
Como nem sempre sou politicamente correta, comprei a sandália, não sem uma certa culpa. Coitada da vaca, além de lhe tirarem o couro, ainda morre virgem - pensei.
Mas que diferença faz pro calçado se a vaca deu ou não? Começo a suspeitar que essa sandália tão fofinha foi feita com a puríssima e honestíssima genitália da vaca. Será? Melhor ocultar da minha mãe esse detalhe sórdido.
(São Luís, abr/2008)